sexta-feira, agosto 25, 2006

Na ante-sala do inferno

"A tristeza é senhora.
Desde que o samba é samba, é assim.
A lágrima clara sobre a pele escura.
À noite a chuva que cai lá fora."

Pelo número de comentários do último
post, deu pra perceber que os leitores estão meio de "saco cheio" dessa história toda de guerra.
Eu também.
Como prometi, vou escrever sobre um assunto mais light.
De fácil digestão...

Tratem de observar bem as três fotos que seguem abaixo.
Presenteio os leitores do Blog do Bean com três curiosidades em que deparei-me num agradável passeio de fim-de-semana na louca Tel-Aviv.
Tudo devidamente explicado.

Antes, um segredinho. Mas prometam não espalhar.
Não foram apenas três curiosidades que encontrei. Foram várias.
É uma sensação gozada. Quanto mais me acostumo com a vida nesse país, mais tenho certeza que Israel é um país extramamente exótico.
E bizarro. Dos mais...

1) Uma das características que Israel tem de bacana é cultivar sua história e o nome daqueles que ajudaram a construí-la.
Dá gosto de ver.
Theodor Herzl, pai do Sionismo Político, é homenageado em praticamente toda cidade israelense.
Não existe um só buraco que não tenha uma "Rua Herzl", um "Teatro Herzl" ou uma "Praça Herzl".

Ramat-Gan, na região metropolitana de Tel-Aviv (chamada Gush Dan), também tem.
E lá gostam tanto do homem que chegam a exagerar.

Já imaginaram entrar num táxi e dizer:
"Motorista, me leva na esquina da Herzl com a Herzl!"
Pois não. É pra já.



2)
Se houvesse um 11o. mandamento, ele certamente seria "E não comerás carne suína"...
Porém, assim como os outros 10, seriam desrespeitados por muitos israelenses.
Como são.

Numa entrada desprentenciosa num supermercado na rua Frishmann, eis que vemos, encostadinho na estante de frios, esperando para serem comprados... bacon e salaminho italiano!

Mas não é esse o ponto.
É possível comprar carne de porco em Israel sem maiores problemas, principalmente nos mercados e lojinhas russas espalhadas por quase todo (ou todo!) o país.

A questão é que nunca havia visto numa embalagem em hebraico!
Além da inscricão "Produto não-kasher" (naturalmente) e o escrito "bacon", o cômico ainda está por vir.
Na lista de ingredientes, ao invés de explicitarem como "carne de porco", preferiram outra nomenclatura.
É possível ler num hebraico simplérrimo, dentre alguns conservantes, a expressão "bassár arrêr" ("outra carne").

Por que não escrevem PORCO, cara pálida?
Para que os fregueses não sintam culpados em comprar?
Se for assim, vou queimar no inferno.
E com gosto!!! (de farofa e de feijão!)



3) O judeu ucraniano Ber Borochov (1881-1917) representa a síntese entra a idéia socialista proletária e o nacionalismo de fundo burguês materializado no que ficou conhecido como "Sionismo-Socialista" (ou, para outros, o Marxismo Sionista).
Ele representa, junto com outras figuras ilustres, a ideologia esquerdista da representação nacional do povo judeu.

Em Tel-Aviv (como alguns dizem, a ante-sala do inferno)
, o pobre Borochov virou nome de salão de beleza.
Ou cabeleireiro, sabe-se lá que raios é isso...



ps1:
Só porque estou no exército não quer dizer que não tenha direito de sair e me divertir um bocado.
No sábado, fui a um show do "veterano" Aviv Geffen, aqui em Jerusalém.
Aviv Geffen, 33 anos, é filho do famoso poeta israelense Yonathan Geffen e sobrinho do ex-Ministro Moshe Dayan.



Em suma, um cara bem polêmico.
Até hoje, Aviv é criticado por ter sido dispensado do serviço militar obrigatório (por razões médicas não muito bem esclarecidas) e suas letras de protesto contra o exército.
Aviv Geffen faz parte de outra geração, com influências até de David Bowie e uma identidade sexual pra lá de ambígua.

Filmei um pedacinho do show.
A qualidade não é das melhores.
Mas quem conhece a música, vai reconhecer...

domingo, agosto 20, 2006

A prostituta e o cafetão

Estou de volta.
Depois de um tempinho, é verdade.
Probleminhas de sono, falta de tempo e muitas... muitas shmirot (guardas) na base, no sul de Israel.
Nada demais...

Mas se é o que vocês querem, falemos então sobre "a guerra"..



A maior discussão na imprensa (e a mais estúpida por sinal) é quem a venceu: Israel ou o Hizballah.
Estúpida porque não é esse o ponto. O buraco é mais embaixo.
Podemos, no máximo, falar sobre algumas conclusões pertinentes que esse embate nos fez tirar.
Analisem comigo:

1)
Numa guerra de um Estado contra um grupo terrorista, é muito difícil apontar vencedores. Justamente por tratar-se do TERROR.
Apesar dos mísseis e dos fogueres, o terror não luta com as mesmas armas de um Estado soberano.

Em primeiro lugar, o efeito psicológico é infinitamente maior nesse tipo de combate. Aliás, a tensão e o medo afetam muito mais a população do que em qualquer guerra que conhecíamos até ontem.



Em segundo lugar, e nesse ponto estão certos alguns analistas israelenses, a tática de guerra do Hizballah se parece muito com as de guerrilha; mas com uma diferença: no caso dos terroristas, civis libaneses são usados sem dó nem piedade.

Depósito de armas e lança-mísseis são instalados sem pudor na casa dos civis (com seus conscentimenos. O Hizballah tem também sua faceta "social", de ajuda aos necessitados com uma rede de saúde e educação.
E do favor em troca).

O sujeito põe a cabeça pra fora do bunker, atira mísseis para cima (sem qualquer noção se o alvo será uma base do exército israelense, um hospital, uma escola ou um asilo), entra novamente, fecha o abrigo e espera.
Repete a mesma operação umas dez, quinze vezes.
Até que vem um avião israelense e destrói a casa.
Três, quatro, cinco crianças morrem porque não estavam no bunker.
Está aí o prato cheio para os pseudo-comunistas-fascistas de plantão e os urubus da imprensa.

Quando mata civis no Líbano, Israel falha e assume o erro e a culpa.

Quando mata civis em Israel, o Hizballah distribui doces nas ruas e faz buzinaço.



Já não é de hoje que qualquer inimigo sabe que Israel não será vencido no campo militar.
A superioridade bélica é bastante significativa.
Chega, então, o elemento TERROR.
O psicológico.
Esse sim pode destruir Israel.

2) Israel sabia desde o início que essa guerra não seria vencida em hipótese alguma no campo de batalha.
Por mais que destruíssem milhares de mísseis nas tocaias dos terroristas, eles nunca acabariam.
A fonte não seca.
Fontes, para os menos informados, são a Síria e o Irã.

Vejamos as perdas e ganhos de Israel na guerra...

PERDAS:

* o alto número de soldados mortos e feridos.
A vida de um soldado aqui, como de para perceber, vale muito.

* Os dois soldados sequestrados continuam no poder do Hizballah.
Se não estiverem mortos.

* A popularidade e o índice de aprovação do governo do primeiro-ministro Ehud Olmert caiu drasticamente.
Os motivos: a "longa" duração da guerra, o alto número de soldados caídos e as denúncias que o chefe do Estado-Maior, Dan Halutz, teria se beneficiado do cargo para benefício próprio em transações bancárias.

* Muitos miluimnikim (reservistas) andam reclamando sem medo da "confusão de ordens".
Foram pkudot (ordens) contraditórias, indecisão, tropas israelenses atirando em tropas israelenses... até soldado atropelado por tanque houve.
Dá até medo.



* o medo do frágil cessar-fogo e que o inferno no norte possa retornar.
Ainda pior.

GANHOS:

* O exército do Líbano e tropas da ONU já estão ocupando o sul do país árabe.
Era esse o objetivo.
Ou o primeiro passo dele.

* Aos poucos, o cerco vai se fechando contra o Irã.
A prostituta é Nasrallah, mas o cafetão é o presidente iraniano Mahmoud Ahmadinejad.
Isso o mundo já entendeu.

* Alguns erros cometidos na famosa operação "Paz para a Galiléia", de 1982, não voltaram a ocorrer.
Israel entrou E saiu do Líbano.
Cumpriu o prometido e não ficou por duas décadas.

Bom, vou ficando por aqui.
Volto no próximo com um assunto mais light (e, como pediram, com vídeo).
O mundo não se faz só de guerras, apesar de que é isso que vende jornal.
O Blog do Bean não está à venda....

terça-feira, agosto 08, 2006

Audio Post 8: Guerra e Paz

this is an audio post - click to play

sábado, agosto 05, 2006

"Venceremos mais uma..."


O imbrólio da guerra continua.
Apesar das mortes e dos carros destruídos, o clima de preocupação em Israel misturou-se, nos últimos dias, com o de otimismo.

Adesivos e out-doors com inscrições "Anachnu Nenatzeach" ("anárrnu nenatzêarr", "nós venceremos", como no detalhe da foto acima) e "Israel é forte" foram espalhados não só no norte, mas em todo o país.

Embora "tentem" e "tentem" assinar um "cessar-fogo" decente, a sensação é que os ataques não devam parar nos próximos dias.
Cerca de 10 mil soldados israelenses estão nesse exato momento no sul do Líbano em várias operações contra os terroristas do Hizballah.

Achei bacana hoje uma matéria do noticiário da noite no canal 10.
Um senhor israelense de 105 anos (mais lúcido que eu) foi entrevistado e esbanjou otimisto. Quanto à guerra, disse em alto e bom som: "não se preocupem. Isso já vai acabar. Israel é forte. Venceremos mais uma..."
Acredito mais nele que na senhora Condoleeza Rice...

Enquanto isso, os mísseis não param de cair.
Mais uma vez, aviso a todos que estou longe da zona do conflito.
Não se preocupem.

Sorte de uns, azar de outros.
A jornalista mexicana Reina Frescó transmitia uma passagem ao vivo de Haifa quando tomou um susto...


O nosso Marcos Losekan também levou o seu.
É só clicar aqui!

Nesse samba do criolou doido, quero tentar colocar ordem na bagunça.
Montei um quadrinho com os ataques do Hizballah desde o dia 12 de julho: mísseis, mortos civis do lado israelense (do lado de lá fica difícil), gravemente feridos, moderadamente feridos e levemente feridos.
Só pra não passar em branco...



ps1: E como alguns devem ter percebido, esse humilde blog ficou movimentado nos últimos dias.
Tudo por causa de uma citação do Blog do Bean no jornal O Globo.
Para quem não viu...



No zoom...

O Blog do Bean fazendo sucesso e eu lá no sul, dirigindo caminhão e vendo a banda passar...

quarta-feira, agosto 02, 2006

Uáquef, o ana batúrra!!!

Monótono.
Assim defino todas as shmirot ("guardas", explicado no post anterior) que sou obrigado a fazer lá na base de Mishmar Haneguev, no sul do país.
Não acontece nada. Ainda bem...

Na foto acima, vocês podem conferir uma das "vistas" que tenho dos postos de controle. Esse fica num dos "cantinhos" da base, de frente para o tzomet ("cruzamento") chamado Eshel Hanassí.
Como disse, nunca acontece nada.

Nas instruções que recebemos dos oficiais antes da shmirá, poucas ordens.
A mais interessante é sempre repetida: "se vocês virem alguém tentando entrar na base pela grade e tiver carregando uma arma, coloque o pente de balas e grite uáquef o ana
batúrra!!!" (pare, senão eu atiro - em árabe).
Instrutivo, não?

Enquanto isso, os foguetes Katyusha continuam caindo no norte.

Hoje, até as 5 da tarde, foram mais de 200.
Um habitante de um kibutz no norte foi atingido diretamente por um deles do lado de fora da sua casa, no jardim, e morreu na hora.

Não creio que a "guerra" vá acabar de um dia para o outro.
Israel já anunciou abertamente que caso o Hizballah devolva os soldados sequestrados, terminará com os ataques imediatamente.
Estamos esperando as soluções. Diplomáticas, à princípio....

No resto do país, o clima (fora de apreensão e em alguns lugares, medo) é de apoio irrestrito aos soldados israelenses.
Apoio moral, que seja.
Eu, por exemplo, que nem combatente sou, já escutei diversas vezes (na rua, no ônibus, no supermercado) a famosa frase "Tishmor al atzmechá", algo como "te cuida".
Demonstrações desse tipo são vistas por todo o lado.

Do lado de fora da tachaná merkazit de Jerusalém (a rodoviária), várias faixas foram colocadas em consideração a todos os soldados que podem ser sequestrados de uma hora para outra.
Nessa, que fotografei, o recado: "Soldado, com você por todo o caminho!"



ps1: A foto abaixo poderia ter sido tirada em qualquer ônibus que atravessa as estradas esburacadas do interior do Brasil.
Um pacato senhor de idade de chapéu de palha e bengala olhando a paisagem e pensando com seus botões tudo que passou pela vida.
Transbordando experiência.

Porém, essa foto não foi tirada no Brasil.
Essa é a linha 470, que liga a cidade de Beer-Sheva à capital Jerusalém.
Seu Sebastião, como o batizei, realmente aprecia a estrada.

O detalhe da foto não é muito perceptível: embaixo do chapéu, escondido porém presente, Seu Sebastião usa uma kipá.
Não deve ser Sebastião. Talvez seja Moshé...



ps2:

Separados no Nascimento 7 - sem comentários...


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